Está plenamente reconhecido que todas as dietas funcionam, desde que haja um défice energético, mas a fase de manutenção é de longe mais desafiante e os hábitos adquiridos na intervenção para emagrecer são determinantes a longo prazo para a manutenção do peso perdido. A monitorização feita pelo próprio parece ser um dos hábitos que parece favorecer os resultados a longo prazo. Mas será a “dieta flexível” a solução?
A utilização de aplicações e gadgets para o controlo da carga de treino já era uma constante na corrida e algumas comunicavam diretamente a informação sobre o gasto energético de um treino com aplicações que funcionavam como diários alimentares.
A utilização de um diário alimentar assim como o conhecimento sobre o valor nutritivo dos alimentos parecem ser ferramentas importantes num programa de emagrecimento1. Inclusive, disponibilizar o valor nutricional da refeição parece afetar a escolha e a porção ingerida de refeições tipo fast food em alguns restaurantes2,3.
As restrições impostas pelas dietas mais famosas e a ideia de que emagrecer é difícil porque temos de abdicar dos alimentos que mais gostamos, e depois comemos demais, levou alguns críticos a começar o incentivo ao princípio mais óbvio do emagrecimento: garantir um défice energético, independentemente dos alimentos ingeridos4 ou da proporção de macronutrientes5.
E assim voltamos aos anos 80 e 90 em que as pessoas voltaram a ser incentivadas a contar calorias através de aplicações como o MyFitnessPal ou o Fat Secret. Este movimento levou ao crescimento da chamada “dieta flexível” inicialmente designada “if it fits your macros” que quer dizer “(pode comer) se encaixa nos seus macros” e quer dizer que podemos comer “tudo” desde que no fim do dia somemos o valor energético e de macronutrientes (proteína, hidratos de carbono e gordura) recomendados para o objetivo. Como todas as “dietas”, uma vez popularizada e conquistados os seus adeptos há quem defenda acerrimamente como “a única” eficaz assim como temos o outro lado, os críticos.
Em que consiste?
No lugar de um plano de refeições com os alimentos e quantidades indicadas assim como os horários recebe: o valor energético, de proteína, hidratos de carbono e lípidos a atingir por dia. E através de uma aplicação das citadas anteriormente deve introduzir o que come para completar esses valores.
O que difere de um plano?
Tem de escolher os alimentos, pesquisá-los nas bases de dados e combiná-los nas quantidades certas. Um nutricionista faz esse trabalho por si quando elabora um plano alimentar.
E como sei quanto tenho de comer por exemplo de arroz?
Na prática, se não tiver qualquer aconselhamento vai por tentativa e erro. Uma sugestão passa por começar a controlar tudo o que come “habitualmente” durante 3 a 5 dias, introduzir na aplicação e ver quanto obtém, depois ajuste as porções em função do recomendado.
Qual a maior vantagem?
O conhecimento é um prémio muito valorizado para esta autonomia, repare que pode aprender a incluir os alimentos que come diariamente nas quantidades certas, inclusive podendo encaixar sobremesas de natal e outros “mimos” no dia a dia. Sabe que quando quer encaixar umas calorias de natal, tem de retirar “outras”.
Parece tudo muito fácil, não tem desvantagens?
Sim, tem algumas, vamos destacar as que sabemos por experiência:
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Ter uma rotina é uma das premissas importantes para o emagrecimento e manutenção3, este modelo pode favorecer alguma “parálise por análise” na enorme variedade de escolhas que tem ao seu dispor;
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As bases de dados disponíveis nestas aplicações são muito diversas e em alguns casos editáveis, logo nem sempre 100% rigorosas no perfil nutricional do alimento. Pode ter a tentação de escolher sempre a opção menos calórica para um prato composto;
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Não deve descurar as bases e princípios de uma alimentação equilibrada;
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A nutrição não é só matemática4, os alimentos e os seus componentes não são todos iguais. Basta pensar que nos alimentos com hidratos de carbono podemos encontrar substâncias com efeito tão diferente como: frutose e glucose (fruta), amido (cereais), amido e fibra (cereais inteiros), amido e oligossacáridos (leguminosas). Tudo soma nos hidratos de carbono mas não têm todos o mesmo efeito no corpo.
Um conselho: não troque o acompanhamento personalizado de um nutricionista por um “plano de macros”, utilize este sistema de forma inteligente registando na aplicação o seu dia a dia no plano prescrito.
Filipa Vicente
Referências
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American journal of physiology. Endocrinology and metabolism, 2017, 313(5), E608–E612.
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Obesity (2017), 25(12), 2018–204
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Journal of the American Dietetic Association (2011), 111(1), 92–102.
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Journal of research in medical sciences (2014), 19(3), 268–275.
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JAMA (2014), 312(9), 923-933