A revista Runners World americana sempre foi para mim uma referência. Já não sei precisar há quantos anos corro, se há 19 ou há 18 anos… mas é algures por aí. E quando se começa a correr a pesar 120kg, com toda a gente à tua volta a dizer que não deves correr porque pesas demasiado e vais destruir as tuas articulações, acho que fiz o que qualquer pessoa minimamente preocupada faz: fui á procura de ler o que os especialistas da corrida diziam. E foi assim que encontrei a Runners World.
Por isso quando no domingo passado me deparo com uma secção na revista, em que aconselham produtos novos aos corredores dei por mim simultaneamente em choque e desiludida. Um dos produtos que aconselham é um spray com cannabis para aliviar os músculos doridos.
Não me estou a fazer de santa nem de iludida. Sei que a cannabis é encarada de ânimo leve, como algo inocente. Posso dizer que com 45 anos nunca experimentei cannabis nem nenhum outro tipo de droga… a não ser claro os fármacos. Não por querer ser snob, santa ou algo do género, mas simplesmente porque já tenho um vicio enorme que é a comida, não preciso de mais. E se sei que é algo mau, para quê correr o risco de viciar?
Depois do choque inicial, decidi debruçar-me sobre o tema e tentar perceber se haveria algum interesse neste género de produto para um atleta.
Comecei por visitar o site deste produto.
Vendem o artigo como sendo um produto feito á base óleos curativos e extractos de plantas. Dizem que a sua fórmula com arnica, menta, zimbro e cannabis, promove o alívio dos músculos doridos, estiramentos, articulações inchadas, pele exposta ás condições atmosféricas e dores severas. Dizem até que alivia condições crónicas como artrite, enxaquecas e síndrome do túnel cárpico. Na explicação dos efeitos de cada uma das diferentes substâncias da sua composição, referem a cannabis como anti-inflamatório e alivia stress. Em rodapé informam que tudo isto que afirmam não foi avaliado pela FDA.
É de conhecimento geral que se recorre a cannabis nos pacientes com cancro para alívio das suas dores e das náuseas e vómitos causados pela quimioterapia, mas descobri que também é usada na epilepsia principalmente em crianças e adolescentes resistentes aos tratamentos convencionais e no tratamento da esclerose múltipla para controlar a epasticidade.
Depois do que fui lendo e falando com amigos, médicos de desportistas, continuo com a minha opinião firme.
Quem me conhece sabe que sou de opiniões fortes.
Para mim desporto é acima de tudo saúde.
Para mim o uso de um spray com cannabis para conseguir correr, nadar ou fazer outro tipo de desporto é pura e simplesmente descabida. Droga para fazer aliviar músculos doridos ??
Eu tenho 2 esporões enormes, um em cada pé e não são eles que me impedem de correr. Tive foi que aprender a saber as minhas limitações. Não adiro ao trail porque uma caminhada de 5km em trail me deixa uma semana com dores horrorosas nos pés. Quando corro tento evitar oscilações de piso e paralelo. Uso palmilhas com 11mm de amortecimento nos calcanhares e assim vou conseguindo curtir o prazer de correr.
E até já sei o que me vão dizer: e então todos aqueles suplementos que o pessoal da corrida e ciclismo tomam para ganhar músculo, potência ou o que seja ? Não são drogas também? É verdade. Se formos puristas, também se podem considerar drogas. Aí já estamos a entrar numa área que dá para amplas divagações com muitos tons de preto, cinzentos e brancos.
Da parte deste produto, e desta onda que parece que vai virar moda, eu mantenho-me fiel aos meus princípios.
Na minha opinião quem entra no desporto amador fá-lo por questão de saúde e prazer.
Não precisa de recorrer a cannabis. E mal escrevo esta frase, lembro-me daquele cheirinho fantástico quando se entra num autocarro em direcção á partida de uma prova… aquela pomadinha básica fedorenta que faz com que todos á nossa volta percebam que algo está mais sensível em nós. As memórias são tramadas. É verdade. Se pensarmos bem, todos recorremos a “drogas”. Mas vamos concordar, que uma pomada mal cheirosa ou um Voltaren que se toma antes duma prova é bem diferente que uma droga como a cannabis. Uma droga que pode levar a surtos psicóticos, problemas de memória, sonolência, problemas de coordenação motora, enfartes cardíacos, disfunção sexual… e a lista continua.
Este tema daria para divagar infinitamente, até porque também poderíamos falar das injecções de testerona que mais recentemente circularam pela televisão. E a lista de produtos é interminável.
A minha sugestão será para, antes de se decidir experimentar algum destes produtos, termos sentido crítico. Pensar: porque estaria a Runners World a aconselhar este produto? A publicidade mantém a revista a funcionar. Até porque dantes era uma revista mensal e agora num ano publicaram 6 revistas. E aí sim, já entendo um pouco melhor o porquê.
Vamos desenvolver sentido crítico numa tema tão importante como a nossa saúde. Só nos foi dado um corpo. Só temos este. Se estragarmos este, somos nós que vamos sofrer as consequências. E se decidirmos experimentar um produto novo, leiam tudo com calma. Meçam os prós e os contras. E decidam. Se decidirem conhecedores de todos os riscos, o corpo é vosso logo a decisão é vossa. Só não dêem o salto, sem saber o que pode estar do outro lado.
Na minha humilde opinião, que vale o que vale, eu permaneço fiel a corpo sã em mente sã.